Raimundo Rodriguez - Arte de Portas Abertas, 2010


Museu Casa de Benjamin Constant

Carrossel: olhos que fitam, mentes que giram.


   Há um movimento giratório concêntrico que de maneira vertiginosa nos captura para dentro de um universo já extinto. Aprisionados nessa camada intermediária entre devaneio e realidade, somos levados a caminhar por um chão batido onde a poeira fina se levanta rapidamente envelhecendo ainda mais os banquinhos de praça e o caramanchão verde ao fundo.
   Nesse cenário bucólico, onde árvores de várias espécies juntam-se ao hermetismo da casa branca do século XIX, encontramos a imagem materializada de uma estrutura deslocada do espaço e do tempo.
   É o que o artista plástico, Raimundo Rodriguez, nos oferta com a instalação “Carrossel”, onde oito cavalinhos de papelão se enfileiram concentricamente em busca de resquícios de infinitas infâncias perdidas, remontando parte de sua íntima memória afetiva.
   Elemento recorrente e de fortíssimo valor simbólico dentro das poéticas do artista, os cavalos, que estão instalados no quintal do Museu Casa de Benjamin Constant, por ocasião da mais recente edição do evento “Arte de Portas Abertas”, apresentam uma construção dentro da linguagem ímpar do artista, onde materiais recicláveis são dispostos de forma, ora a evocar imagens afetivas, ora a evocar aspectos da contemporaneidade que por meio de uma quase alquimia, converte material frágil em material nobre.
   Os oito cavalos de papelão, envelhecidos com verniz e betume, aparentam a solidez e o peso da madeira barroca, imagem na qual Raimundo Rodriguez tão fartamente se serve em seus trabalhos, conferindo um tom amarronzado com cores difusas e um odor de coisa antiga.
   A partir do eixo de ferro que se fixa ao chão, vemos inteiramente a estrutura simples atingir cerca de 4m de diâmetro por 2,5m de altura, de onde as hastes, feitas de madeira reaproveitável, ligam-se aos cavalos formando o carrossel.
   Nos olhos dos oito cavalos vemos um reflexo negro-azulado próprio das bolas-de-gude, um outro elemento que remete a brincadeiras infantis quase que inexistentes nos dias de hoje, ao mesmo tempo em que, nas celas dos cavalos, materiais como os discos compactos – cd´s são incorporados nos trazendo momentaneamente de volta ao espaço-tempo real, num ir e vir constante, moroso.
   Contemplar a instalação “Carrossel” é ludicamente olhar de soslaio para o passado, reaprendendo a lição tautológica da vida, e ao final de uma volta de 360 graus, retornar suavemente para o presente. Parado ou em movimento é essa imagem atemporal que o artista plástico Raimundo Rodriguez nos presenteia, recompondo os delicados fragmentos de inúmeras e anônimas infâncias perdidas revitalizando, por conseguinte, vivências atuais.


03/09/10
Renata Gesomino
Doutoranda na linha de Pesquisa de História e Crítica da Arte pelo PPGAV-UFRJ.

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