O Farol, o Mar... e o Artista

O farol e o mar. Ambos constituem um poderosíssimo referencial poético dentro da literatura universal, além de evocar imagens capazes de narrar grande parte da história das civilizações e suas conquistas sobre a natureza. Desde o mar idealizado por Ernst Hemingway com seu eterno embate entre o homem velho e o peixe gigante, até o farol discreto e sisudo, ponto alto na narrativa existencial dos frios personagens do romance de Virginia Woolf. O mar e o farol. Enquanto o primeiro se constitui como força incontrolável da natureza, capaz de guardar sob seu manto ultramarino as criaturas mais fantásticas com que a humanidade tem sonhado, já, o farol, se impõe como “porto seguro”, local de projeção luminosa, torre inabalável, cuja finalidade é guiar os bravos navegantes, rumo à glória, desde os remotos tempos de Alexandria.

No projeto que pretende reunir em uma enorme instalação com dimensões de 9,50m de largura X 5,50m de profundidade X 5,15m de altura, as obras: “O Farol” de Deneir de Souza e “O mar” de Raimundo Rodriguez, o resultado final é a construção de uma poética visual na qual o Farol - elemento estático e imponente se agiganta diante de um mar voluptuoso e inquieto.

A partir desse movimento permanente do mar, é dada ao espectador a possibilidade de observar a verticalidade sóbria do farol em relação às ondulações vertiginosas de um mar vivo, pulsante, mas que não esconde as suas engrenagens. O projeto fica composto por grandes rodas de ferro que funcionam como suporte para as cristas das ondas. A partir de motores elétricos essas ondas passam a adquirir um movimento circular moroso, mas contínuo. Diferentes planos dão a noção de profundidade, fazendo com que as ondas se encontrem em alturas distintas e o mar ganhe em volumetria e mobilidade. Luzes são instaladas estrategicamente, por entre os elementos da composição, de forma a contribuir com o movimento desordenado de esquerda para direita e de direita para esquerda, dando ao balé das ondas, ritmo e cadência. O farol de Deneir, fixado sobre uma caixa de madeira 1,20m x 1,20m x 2,00m, reproduz os sons das ondas do mar, dos pássaros e do vento, por meio de alto-falantes embutidos dentro de seu suporte, revelando através dos sons o testemunho de um guia, de um sobrevivente. Dessa maneira o conjunto da obra se completa e a experiência do observador de adensa diante de um mar que não esconde as suas origens humanas, revelando seu intrincado mecanismo de ação, através de suas engrenagens, rodas e correntes.

No universo subjetivo das artes plásticas, o mar e o farol são agentes simbólicos criados pela mão do homem, pela mão do artista, e a disputa entre homem e natureza encontra seu fim, e saímos todos vitoriosos.

Renata Gesomino.
Doutoranda na linha de pesquisa de História e crítica da arte pelo PPGAV-UFRJ.